Hiroshima, Mon Amour (1959), a memória e o esquecimento

Do famoso cineasta Alain Resnais, este filme apresenta-nos, embora de uma forma simbólica, a memória da bomba atómica, que em 1945, arrasou a cidade japonesa de Hiroshima.

As duas memórias desse mesmo acontecimento, uma interna – a do japonês (Eiji Okada), cuja família faleceu em Hiroshima – e a outra externa – a da francesa (Emmanuelle Riva), que parte de Nevers para Paris, depois do assassinato do seu grande amor, o soldado inimigo alemão e sequente castigo pela desonra – cruzam-se, resultando daí uma intensa história de amor.

O japonês relembra à francesa o seu falecido namorado. A forma como o japonês mexe as mãos enquanto dorme, tal e qual como mexeu o alemão antes da morte…

Hiroshima Mon Amour 1

À semelhança da história de amor que viveu com o alemão, o amor que se desenvolve entre ela e o japonês é também proibido, isto porque ambos são casados e porque a sua estadia em Hiroshima terminará em poucas horas.

Para além das imagens de arquivo, que reforçam todo o sofrimento causado pela bomba, o realizador recorre constantemente a jogos de luz e sombra que se fazem sentir sobre os atores, como que a representar o sofrimento, o esquecimento do sofrimento e a memória que restou desse sofrimento.

Hiroshima Mon Amour 2

Embora a francesa não tenha vivido de perto Hiroshima, aquando do rebentamento da bomba, a sua memória construiu uma Hiroshima própria (a morte do seu primeiro amor e a clausura) que, tal como a cidade, teve de renascer das cinzas.

Newness (2017), um filme sobre as relações da atualidade

Depois de se relacionarem com várias pessoas, por intermédio de um aplicativo móvel, Gabi (Laia Costa) e Martin (Nicholas Hoult) acabam por cruzar caminhos, embarcando numa relação aparentemente madura mas que se agita com o passar do tempo.

Durante a primeira meia hora, aproximadamente, o filme entusiasma-nos: apresenta-nos as personagens, a forma como estas vivem a sua vida, os seus trabalhos e os seus encontros através da app

Mas, aos poucos, o filme começa a perder o fôlego, instala-se o drama, e nem mesmo a agitação da relação dos protagonistas, através da concretização de várias fantasias sexuais envolvendo terceiros, permite ao espetador recuperar o entusiasmo seguindo este aborrecido até ao final.

As relações abertas ou, melhor dizendo, não monogâmicas (até certo ponto) estão e estarão cada vez mais presentes nas nossas vidas e, neste sentido, é importante que sejam trabalhadas, não só pelo cinema como por outras artes, para se facilitar a sua inclusão social.

Infelizmente o filme não as encara, às relações abertas, com o objetivo acima citado. Isto porque Gabi afirma, já perto da conclusão do filme, que está farta de ter uma relação “assim” e que está na altura de viver com Martin uma relação a sério.

É principalmente neste ponto que o filme desilude, ao lançar a ideia de que uma relação que não seja a dois não é de todo uma relação “a sério”.

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Apesar da narrativa pobre, a interpretação dos atores é convincente, ao mesmo tempo que é comovente.

Gabi que se apresenta como uma jovem sem pudores é, também, ingénua, deixando-se levar por Larry (Danny Huston), um homem bastante mais velho que acaba por tratá-la como se esta fosse uma “vendida”, que apenas está ao lado dele porque este lhe oferece regalias em troca.

Já Martin, que no início tem dificuldades em falar sobre o seu passado, surpreende positivamente o espetador devido à densidade que adquire ao longo da trama e que resulta dos problemas que enfrentou, como a morte da irmã ou o aborto da ex-mulher.

A temática relativa às tecnologias, e nomeadamente a das relações digitais, é destacada no filme por diversas vezes: através dos primeiros encontros, do romance de Gabi e Martin, das fantasias que concretizam.

App

Esta é, certamente, uma das consequências da vida fugaz da modernidade, que faz o espetador refletir sobre si e sobre a sua relação, quase que (se não mesmo), obcecada por elas.

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Nota:

Passados 50 minutos de filme sucedem-se uma série de planos onde os protagonistas estão deitados na cama a discutir sobre a possibilidade da sua relação se tornar aberta. Gabi encontra-se do lado direito da cama (1ª imagem) e Martin do lado esquerdo (2ª imagem), sendo que o primeiro plano se vai alternando entre um e outro à medida que cada um fala.

Entretanto vemos um plano geral do quarto e os protagonistas assumem posições distintas das iniciais na cama (3ª imagem).

Findo este plano voltam às primeiras posições.

Propositada ou não, a verdade é que esta série destabiliza a fluidez do filme parecendo ser uma falha significativa, provavelmente, da pós-produção.